Fernando Pessoa
Primeiro Fausto
Segundo Tema: O Horror de Conhecer
Maurice Denis «Sans titre»,
huile sur toile
I
O inexplicável horror
De saber que esta vida é verdadeira,
Que é uma coisa real, que é [como um] ser
Em todo o seu mistério
Realmente real.
(...)
A realidade dói com correntes enferrujadas de consciência rotineira. Ainda que a ferrugem, enquanto humana ferrugem, dos elementos químicos, não oxide quimeras. Eis a fuga! A doce, terna e breve…tão breve que amarga, que devora – Fuga!
Erguem-se vórtices de gritos crescentes! São hostes negras que ecoam a voragem de caliginosos demónios! Erguem-se moribundos e babosos, de entre fendas nocturnas!
Isto tudo, dentro do meu café matinal, mais dentro ainda, dentro do eu mexer o café de manhã. Rugem inventados os demónios. Se sonho é verdade, eu tremo! Felicidade?! Sim, nestas migalhas de Tempo, quando estou a sós com os meus demónios e o sonho se espalha em tudo o que é, por não existir. Feliz, sim…até ter de acordar para pagar a conta, arrumar os livros e pôr a caneta no sítio da caneta, e apertar os cordões que por teimosia se desapertam…todos os dias. E isto, que esmaga o anterior isto ali de cima (sempre de cima, porque esse voa), cansa e faz sono. Tanto sono…
Para que a interpretação analítica e objectiva, de certas línguas vesgas, me não acuse, injustamente, de hermetismo complexó-ininteligível (quiçá talvez poético…), deixo uma breve análise, mais precisa e c-l-a-r-a, dum outro poema de Pessoa. Pois sempre saúdo os emproados, com beijos nos seus olhos não abertos.
O que me dói não é
O que há no coração
Mas essas coisas lindas
Que nunca existirão...
São as formas sem forma
Que passam sem que a dor
As possa conhecer
Ou as sonhar o amor.
São como se a tristeza
Fosse árvore e, uma a uma,
Caíssem suas folhas
Entre o vestígio e a bruma.
Fernando Pessoa, 5-9-1933
Os dois primeiros versos são concomitantes da linha de pensamento pessoana, visto justificarem a dicotomia entre a dor espontânea, pertencente ao domínio do sensível, e a dor intelectualizada, do domínio do pensamento.
Há, portanto, uma clara cisão entre a razão e a emoção, sendo que esta última se torna secundária, pois o poeta “sente com a imaginação” (como o diria no poema “Isto”) e não com o coração, ou seja, as emoções são intelectualizadas, de modo a cumprirem com o conceito de veracidade artística.
Assim, de acordo com Fernando Pessoa o poeta não deve senão “sentir literariamente as cousas”, suprimindo a sinceridade humana em detrimento do fingimento artístico.
Neste contexto, o que dói não é “o que há no coração” mas o que existe no pensamento, trata-se, portanto, duma dor transfigurada.
Percorrendo, ainda, a mesma estrofe do poema, surge, logo no verso seguinte, a expressão “coisas lindas”, peculiarmente pessoana.
“Essas coisas lindas” pertencem a uma dimensão de beleza artística idealizada pelo poeta, e são o resultado da transfiguração, através do pensamento, dum conjunto de vivências espontâneas, inseridas no domínio do real, e de vivências constituídas, por sonhos, criadas com o auxílio da imaginação, que por sua vez, é o elemento impulsionador que permite ao poeta fingir sentimentos.
E, de facto, “essas coisas (…) nunca existirão” ao nível do concreto, pois, de acordo com o que foi referido anteriormente, pertencem à dimensão do Ideal, que é forçosamente abstracto.
Finalmente, quanto à última estrofe, a sua estrutura passa inteiramente pelo uso da comparação, que está ao serviço da forma como F.P. pretende transpor a sensação de vago, de subtil, característica dum domínio Ideal e, por isso, impreterivelmente, enigmático e abstracto, daí também a presença dos vocábulos “vestígio” e “bruma”. Curiosamente, se se explorar mais esta ideia, poder-se-á, até, pensar que, quando se não tem um conhecimento concreto das coisas surge a necessidade do uso da comparação, para, neste contexto, descrever as “coisas lindas” na sua ampla concepção imaginária.
Os dois primeiros versos são concomitantes da linha de pensamento pessoana, visto justificarem a dicotomia entre a dor espontânea, pertencente ao domínio do sensível, e a dor intelectualizada, do domínio do pensamento.
Há, portanto, uma clara cisão entre a razão e a emoção, sendo que esta última se torna secundária, pois o poeta “sente com a imaginação” (como o diria no poema “Isto”) e não com o coração, ou seja, as emoções são intelectualizadas, de modo a cumprirem com o conceito de veracidade artística.
Assim, de acordo com Fernando Pessoa o poeta não deve senão “sentir literariamente as cousas”, suprimindo a sinceridade humana em detrimento do fingimento artístico.
Neste contexto, o que dói não é “o que há no coração” mas o que existe no pensamento, trata-se, portanto, duma dor transfigurada.
Percorrendo, ainda, a mesma estrofe do poema, surge, logo no verso seguinte, a expressão “coisas lindas”, peculiarmente pessoana.
“Essas coisas lindas” pertencem a uma dimensão de beleza artística idealizada pelo poeta, e são o resultado da transfiguração, através do pensamento, dum conjunto de vivências espontâneas, inseridas no domínio do real, e de vivências constituídas, por sonhos, criadas com o auxílio da imaginação, que por sua vez, é o elemento impulsionador que permite ao poeta fingir sentimentos.
E, de facto, “essas coisas (…) nunca existirão” ao nível do concreto, pois, de acordo com o que foi referido anteriormente, pertencem à dimensão do Ideal, que é forçosamente abstracto.
Finalmente, quanto à última estrofe, a sua estrutura passa inteiramente pelo uso da comparação, que está ao serviço da forma como F.P. pretende transpor a sensação de vago, de subtil, característica dum domínio Ideal e, por isso, impreterivelmente, enigmático e abstracto, daí também a presença dos vocábulos “vestígio” e “bruma”. Curiosamente, se se explorar mais esta ideia, poder-se-á, até, pensar que, quando se não tem um conhecimento concreto das coisas surge a necessidade do uso da comparação, para, neste contexto, descrever as “coisas lindas” na sua ampla concepção imaginária.
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8 comentários:
Lamento, mas dou comigo sem saber como resistir ao meu jeito de dizer sem o dizer, para que leiam o que lá não está escrito...
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8S
"O topico com mais comentarios da fornada... Isto deve ser bom!"
julguei inocentemente...
afinal...
(meio caminho andado para se ser loucamente amado é comprar um espelho xD )
{feel free to quote me...}
"Se não tivesses posto o primeiro o segundo não estava uma m*rda..."
interpreta ;)
Vá V. Exm.ª pontuar as suas dissecações masturbatórias e provocatórias aos (acabo pessoalmente)
Olhe e a pensar em si:
Momento de ternura Maria de Lurdes
In Público, 28 de Novembro de 2008:
Garante, contudo, que também tem tido bons momentos. "Muitos". Pede-se-lhe que partilhe um. "Uma carta que recebi de um menino que recebeu um computador para ter em casa, não sei já em que circunstância, e escreveu-me a dizer: 'Quando for grande, vou inscrever-me no PS.' É tocante."
gosto particularmente daquele aspecto...
Ah areias qdo me lembro d ti sou a favor da clonagem humana
"{feel free to quote me...}"
Veja lá se não quer que lhe quote essa língua fora!
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