Este é um espaço para os meus alunos de Português... os que o são, os que o foram... os alunos da Escola Secundária de Barcelos... (e seus amigos que, se "vierem por bem", serão muito bem recebidos!)... Poderá vir a ser um ponto de encontro, onde a palavra escrita imperará, em liberdade, criativamente, para além das limitações da sala de aula, porque acreditamos que escrever não é "um acto inútil"... inútil é calar.
segunda-feira, 11 de maio de 2009
Loba em mim
Era quase noite quando abri os olhos. Não reconheci de imediato o lugar onde estava, mas também não me importava com isso, sabia que nunca mais poderia voltar para o lugar de onde tinha vindo. Toda a informação que eu tinha estava ainda a fervilhar dentro de mim. Não conseguia acreditar no que me tinham dito, nem queria.
Levantei-me sem pressa, a lua estava quase a aparecer. Agora minha mente vagueava sem lugar preciso. Ter deixado tudo para trás foi mais fácil do que alguma vez pensei que seria. Não havia arrependimento dentro de mim, nem nostalgia. Talvez porque, finalmente, estava a seguir o meu caminho. Apenas sentia um vazio que não queria preencher.
Toda a minha vida tinha tentado negar o que estava na minha frente. Apenas não queria ver, para não ter de enfrentar. Agora que chegou a hora estava calma, como se toda a minha vida tivesse caminhado para aquele momento. Em certa medida tinha sido assim mesmo, mas no final quem escolheu foi ela.
Saí da cabana em direcção ao riacho que ouvia ao longe. Apesar de ser Inverno e haver neve até à altura dos meus joelhos, eu não sentia frio, e o riacho nunca parava de cantar durante todo o ano. Sabia que não era necessário ser assim, se eu quisesse. Mas afinal se não fosse assim ia ser como? Não queria a vida que tinha.
A água do riacho cantava como quem chamava por mim. Não fugi desse chamamento nem me apressei a responder-lhe. A lua estava quase a aparecer, mas ainda havia tempo para uma última despedida.
Olhei para uma pedra que estava perto e era grande o suficiente. As letras começaram a aparecer numa linha perfeita, pareciam desenhadas. Todo o meu amor e desespero iriam ficar para sempre gravados naquele lugar.
Tudo o que eu sempre quis está aqui
A água, a terra, a lua
O desespero faz parte de mim, assim como o sonho
Lutei e vou continuar a lutar
Até ao dia em que o sol encontrar a lua
Até ao dia em que a lua encontrar o sol
Eu estarei aqui
A lua apareceu em todo o seu esplendor por cima de mim. Fazia um círculo perfeito contra o negro do céu. Não tive medo como esperava que iria ter. Eu estaria sempre ali, o meu coração ficaria para sempre ali.
A transformação não foi dolorosa, nem perto disso. Parecia que uma magia actuava em mim de uma forma que me fez entregar totalmente sem qualquer reserva. Tudo o que foi modificado era apenas a forma física, como eu esperava, o meu coração continuava ali.
Olhei na água que corria e cantava ainda mais alto. O reflexo não me assustou como eu esperava. Era claro que estava diferente, mas os meus olhos continuavam ali, sem medo, com uma calma que fazia o meu coração transbordar de alegria como nunca esperei que pudesse acontecer.
Agora seria uma loba, eternamente, até ao dia em que o sol encontrar a lua, até ao dia em que a lua encontrar o sol.
Sugestão: ler acompanhado desta musica “Kiss the rain” de Robert Patinsson
Andreia Senra, 12ºB
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1 comentário:
Belo texto, Andreia. Belíssimo. Que boa surpresa, não te conhecia este talento! O texto texto lembra-me um romance que li há anos (tantos que já nem me lembro do título, o livro não era meu), mas que me impressionou muito. A acção desenrolava-se nos primórdios da humanidade e havia essa identificação entre o ser humano e o animal (nas tribos índias, na verdade, muitos rituais incluem essa identificação...).
Gostei muito, mesmo. Do tema e do estilo. Continua assim, miúda! Gostei do teu lado "lunar" ;-)
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