sexta-feira, 28 de novembro de 2008

Ah a frescura na face de não cumprir um dever!



Ah a frescura na face de não cumprir um dever!

Faltar é positivamente estar no campo!

Que refúgio o não se poder ter confiança em nós!

Respiro melhor agora que passaram as horas dos encontros.

Faltei a todos, com uma deliberação de desleixo,

Fiquei esperando a vontade de ir para lá, que eu saberia que não vinha.

Sou livre, contra a sociedade organizada e vestida.

Estou nu, e mergulho na água da minha imaginação.

É tarde para eu estar em qualquer dos dois pontos onde estaria à mesma hora,

Deliberadamente à mesma hora…

Está bem, ficarei aqui sonhando versos e sorrindo em itálico.

É tão engraçada esta parte assistente da vida!

Até não consigo acender o cigarro seguinte… Se é um gesto,

Fique com os outros, que me esperam, no desencontro que é a vida.




Álvaro de Campos





Este poema de Álvaro de Campos, que como devem saber é mais um dos muitos heterónimos de Fernando Pessoa, cativou-me porque de uma forma simples expressa a vontade que todos temos, por vezes, em romper com todas as convenções da sociedade.

O poeta começa por associar o desleixo e o não cumprimento de um dever a uma sensação de bem-estar físico, a frescura na face. No entanto, este bem-estar não é completo uma vez que Campos diz “Respiro melhor agora que passaram as horas dos encontros.”, ou seja, o poeta apesar da sua aparente despreocupação sente-se mais aliviado quando a hora do encontro passa e já não pode comparecer.

Nos versos seguintes o poeta informa o leitor que esperou ter vontade para comparecer aos encontros marcados mas esta não chegou.

O “lá” do sexto verso remete-nos para um local controlado por normas sociais estritas e castradoras às quais o poeta tenta escapar, percebemos assim que ele rejeita as normas impostas pela sociedade e que tenta evita-las uma vez que chega ao ponto de marcar encontros à mesma hora faltando a ambos.

Voltando um pouco atrás no poema temos os versos que eu mais gostei neste poema “Sou livre, contra a sociedade organizada e vestida. /Estou nu, e mergulho na água da minha imaginação”.

Nos versos transcritos acima o poeta declara-se um indivíduo livre contra a sociedade que se encontra vestida de preconceito, regras e atitudes politicamente correctas. Do outro lado temos este indivíduo que mergulha nu na sua imaginação, devaneando, errando, imaginando sem dar importância ao que é socialmente aceite, ou seja, despido de todos preconceitos.

Na última estrofe o sujeito poético considera-se um assistente da vida, ou seja, o poeta não toma parte na vida considera-se um mero espectador.

Esta é a única parte do poema com a qual não concordo. Por mais castradoras que a realidade e a sociedade em geral sejam não nos devemos refugiar apenas no sonho e assumirmo-nos como espectadores da vida, devemos tomar parte nela e tentar fazer o mundo um pouquinho melhor, um pouquinho menos preconceituoso, um pouquinho mais humano. Não estou a dizer para deixarmos de parte o sonho, mas sim transportá-lo para a nossa realidade. Acima de tudo devemos fazer de cada dia um sonho tornado realidade, para não termos de marcar encontros à mesma hora para arranjar uma desculpa para não ir a nenhum deles.

Ana Paula Portela. 12ºB

[texto ainda por editar pela professora]

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