Este é um espaço para os meus alunos de Português... os que o são, os que o foram... os alunos da Escola Secundária de Barcelos... (e seus amigos que, se "vierem por bem", serão muito bem recebidos!)... Poderá vir a ser um ponto de encontro, onde a palavra escrita imperará, em liberdade, criativamente, para além das limitações da sala de aula, porque acreditamos que escrever não é "um acto inútil"... inútil é calar.
segunda-feira, 31 de março de 2008
Roads
por ruído e fumo lamacento;
Marcham, emparelhados,
sobre longos fios de negro.
Deslizam, dominados,
pela geometria das linhas;
Movem-se, agitados,
na impaciência das buzinas.
Aguçam, velozes,
as suas lâminas e vidros;
Cortam, exangues,
Mãos, olhos...amantes em gemidos.
Oh como seduz a vossa derme;
Tão lustrosa, tão macia e reluzente!
Não fosse o descascar-se com a unha,
mostrá-la nua, torpe e decadente!
Mas, eis que ao vosso lado:
Fracos
Poeirentos,
Seguem, os humanos,
por ruído e fumo lamacento;
Marchando, emparelhados,
sobre longos fios de negro.
quinta-feira, 13 de março de 2008
Camoniano
Passo a passo me afasto, relutante
Lágrimas no rosto, olhar perdido
Atrás de mim, um mundo sem sentido
O sonho vivido já vai distante
Já não sopram os ventos da sorte
Porquê continuar minha vida?
Mataram-me o Amor, não há saída
A Morte chega, beija minha face
Ergue-me a alma e vejo como é bela
E estende-me sua mão de donzela
Pego sua mão delicada, e vou
Para trás, olho lentamente e penso
Como estará aquela que me matou?
Óleo de Soledade
Entrei. A mochila cansada escorregou-me das mãos e caiu no chão. Por instantes, fiquei a contemplar aquele trapicalho junto aos meus pés, vergado e ofegante. Caiu no chão.
Carreguei-me até à cozinha enquanto observava a mochila a ficar cada vez mais só. Tinha a aula de biologia na cabeça e tinha fome na barriga. Os meus olhos de toalha, cobriram esfaimados a mesa de jantar, até repararem no papel:
“Oh Banana frita as batatas!
Nuno”
Acendi o fogão e pus o óleo a aquecer. O papel mandava-me fritar as batatas.
E aos meus sentidos, já faltava a presença de barulho. Carreguei num botão, para que logo uma figura começasse a falar de civismo e a mendigar-me atenção, mas eu não tinha trocados. Desliguei-a. Pela casa espalhou-se o silêncio da vizinha a acordar o carro e do canário a chilrear. Mas, inopinadamente, o telefone tocou para que eu atendesse...mas pensei no óleo, pelo que fingi um estado efémero de surdez. Então, o telefone, para me obrigar a subir as escadas, decidiu gritar no meu pensamento. “Será rápido”, avaliei.
“- Sim?! – ouço um choro sufocado, muito doce, muito velho.
- Quem fala?
-Paula? És tu filha? – perguntou a voz sufocada.
- Não desculpe, deve ser engano…ainda bem – pensei, já a afastar o telefone do ouvido para o desligar.
- Donde fala?
- De Barcelos.
- Ah…a minha filha quando andou na Póvoa de Lanhoso a estudar, tinha uma amiga de Barcelos. Não a conhece?
- Não, não a conheço.
- Oh minha qu’rida, como te chamas? A tua voz é tão igual à da mi neta.
- Chamo-me Cláudia.
- Que Deus te abençoe e te dê muta força, muta força e te guie… Oh minha qu’rida eu estou muto sozinha, toda a tremer....já tenho 80 anos. Vivo nesta casa há 40 anos. Quando vim p’ra Braga não havia casas nenhumas, agora tem mutas. Eu nasci em Montalegre. – soluçou em angústia.
- Minha Senhora…
- Tenho 2 filhas: uma é professora e está casada. O meu genro é vet’rinário aí em Barcelos. Olha eu tenho 2 stands de automóveis, minhas e do mê neto…dói-me tanto as artroses - dominou-a um choro aflitivo.
- Esteja calma. Então e as suas filhas? Não a visitam? (o óleo…oléo!)
- A minha filha é professora. Que idade tem a minha qu’rida?...sabe os professores, hoje em dia, estão muto mal e ela já não vem aqui e eu estou tão sozinha… – gemeu.
- Olhe minha senhora – o óleo já me queimava, com dilema, as emoções – vou pedir-lhe que ligue para o 112, está bem? Assim, vem logo alguém ajuda-la.
- Eu tinha tantos amigos em Barcelos! Conhece o dono da pastelaria Pérola? Os Azevedos?
- Como se chama a Senhora?
- Eu? Glória Cardoso.
- Senhora Glória vai fazer o que lhe disse está bem? …Ligue para o 112!
- Mas eu não vejo bem, nem sei escrever. Fui operada à pouco às vistas.
- Glória Cardoso, onde mora?
- Em Braga, moro cá à 40 anos. Deus te abençoe por falares comigo! … - os meus olhos fritos…começaram a chorar…choramos as duas sob os números de 1 a 9.
- A Sra Glória consegue andar?
- Oh filha doem-me muito as artroses – torceu-se num tom plangente.
- Faça assim, vai pôr a mão sobre o telefone, mas não carregue nos números. Ponha lá! Sente-os? – disse, morrendo a 180º.
- Eu ponho, mas o meu telefone é dos pequenos e eu carrego nos números p’ra ligar à minha filha.
- Olhe depois de desligar o telefone, vai carregar duas vezes no primeiro botão da fila de cima de todo, que está à sua esquerda, está? E a seguir carrega uma vez no que está ao lado. Duas vezes no primeiro e uma no que está ao lado.
- Deus te acompanhe e te abençoe e te dê muta força!
- Um beijo muito grande para si, Sra Glória. Um abraço muito forte...a senhora vai ficar bem. Tenho mesmo que ir é que o meu fogão está ligado.
- Ai que vais esturrar o cozido pro minha causa…Muitos obrigados minha qu’rida.
- Tudo de bom para si!
Arrastei-me pelas escadas abaixo, “Deus te acompanhe”. Desliguei o fogão. O óleo estava queimado, muito queimado. Menos do que eu, muito menos.
quarta-feira, 12 de março de 2008
Editorial
Estava aqui entretida a fazer o jornal dos escuteiros de galegos (do qual sou directora e única a trabalhar para que ele saia!!!) e lembrei-me que infelizmente tinha de fazer o editorial. Para mim e para todos os que fizeram o jornal é a pior coisa de fazer... mas num momento lembrei-me de algo e saiu isto...
"Quase todos os dias vemos na televisão notícias de pessoas que são mortas injustamente, mas onde será que isto vai parar?
Estas noticias aparecem não pelo facto de agora existir uma maior criminalidade mas pelo facto de vários valores morais não serem cumpridos, dos direitos do homem não serem defendidos. Existem direitos que devem ser cumpridos para que a nossa sociedade seja no mínimo coesa.
Todos nós temos direito a viver, e nunca devemos negar esse direito pois é o que dá sentido a tudo. Para vivermos felizes temos de dar valor aquilo que nos é importante e amarmos aqueles que nos são mais queridos.
Amar é um verbo que deve ser aplicado em tudo, pois tudo tem o direito a ser amado e a amar e nós, como cidadãos, devemos amar não só aquilo que gostamos e as pessoas que admiramos mas também aqueles quem não gostamos e que nos fazem mal pois só assim podemos ser felizes.
Vamos amar tudo e todos sem pensar no dia de amanhã, pois só assim podemos amar verdadeiramente e podemos também modificar esta realidade que é deveras cruel e dura! "
(culpem a teta porque foi ela que me disse para postar)!!!
sábado, 8 de março de 2008
soneto...
Aguardo alcoolizado a tua presença
Pois teu espectro de sol, espectro d'agoiros
Mergulhou-me em paternal desavença...
Raivoso como colosso enterrado
Num peito que palpita, latejante
Sepultado aguarda um desejo pardo
No pequeno e verde olho do gigante
Oh, mas não se desfaz sobre o luar
A materna malha da minha ausência
Testando a minha dócil paciência
Quanto ao tempo que o deixarei ficar
Ocupando o meu trono por direito
Há muito fundado em dourado leito
sexta-feira, 7 de março de 2008
Sabes amar?
...
3palmos à frente do meu braço
sempre, sempre...
longe como o cio dos cães fartos
de travos a esperança dos homens
solitários ou pior...
Sozinhos, perdidos entre as irís
tão numerosas como as rugas
das montanhas meninas
num mundo podre
de velho
de seco...
viscoso e verde e voraz
e pantanoso à potência de quem faz
feridas em pele alheia
abissais como as folhas de palmeira
que há muito presenciam
o deturpar das efémeras inocências
já há muito condenadas pelos avós
dos que fomentam perdas de consciência
onde o álcool sempre presente é ubíquo
potente e ridículo
e o soberano
do qual assenta o pináculo
nas mortes dos pardais que labutavam
por cravar melodias em ventos secos
desprovidos de tantas
sei lá, efervescências
porque belos são os rios de sangue
onde borbulham dores
deleites, secos, banhados
em leite de mula como belezas de antigamente
porque é pena como foi não o ser sempre
quando palhas e penedos
Imperavam sobre os rochedos
molhados, palpitantes, de carne
onde fluem rios e não espíritos
nem almas
pena...
o que eu não dava para que todos fossem amados
como eu me amo, como amo a ilusão na qual desde sempre alguém me ama...
gotas, chove nesta folha
mas não há chuva no telhado
secas repousam as telheiras
como há pouco o faziam minhas bochechas...