domingo, 4 de outubro de 2009

A Viúva


A viúva diz que
quando a tristeza é profunda e irremediável,
as lágrimas acabam por secar com o seu próprio bafo:

Porque nem a água, apesar do sal,
resiste a tão quente dor.

A pureza eleva-se ao céu sob ebulição.

Porque nem os sentidos
se sabem expressar
de tão estarrecidos que ficam.

À tristeza bruta até o medo sucumbe…

Porque nem o rosto da tua mãe
lembras
de tão estranha ela te ser.

…até a memória se prostra.

Porque tudo pára e se entrelaça no teu pescoço,
que já nem teu é.
Tudo se acorrenta mecanicamente
àquilo que pensamos que somos,
e que afinal, em linguagem de tristeza,
De nada nos vale.

- Porque, perante a eternidade da minha treva interior
Nada se ergue, Nada se rivaliza
nem mesmo o murmúrio desta criança
que dizem ser meu filho.
Amor, meus olhos há muito que secaram…

E fora a esta Viúva que nos entregámos
logo à nascença.
E é esta
Viúva de vida que nos espera,
um por um,
no final da nossa malha descosida.

Tristezas não pagam dívidas,

nem alfaiates


Mas à tristeza bruta, até o medo sucumbe…

…até a Viúva chora
onde a morte se esconde.

1 comentário:

Fátima Inácio Gomes disse...

... malha que o império tece...