quinta-feira, 28 de julho de 2011

Post mortem


Vêm morrer em mim com a calma esguia dum felino. Enroscam-se na sombra palmeiral do meu cansaço e sucumbem a este dia africano de rios secos.

Cheiro a cemitério lotado por guerras idas.

Infértil, por entre esta vala comum onde ciranda o silêncio das almas gastas, lembro viagens fundas, como um poço de reflexos jazidos que a chuva desistiu de visitar.

Vêm e morrem caladas, as minhas memórias de ti.

terça-feira, 19 de julho de 2011

3 am

As pessoas esquecem-se. Do que fizeram e do que são feitas. Esquecem o parentesco, o ancestral, a anterior faísca laminada p’las pedras.

As pessoas esquecem como respiram, necessária e maquinalmente. Esquecem e não lembram. Nem o comum órgão que as acolheu com a mesma vontade que as libertou, para virem a Ser.

Esquecem o útero das estrelas, onde repousaram em tempos maiores que a estadia de agora nas suas vidas modernas;

Esquecem tanto e tão fundamente, que já nem recordam a explosão mãe que as semeou pelo espaço;

E crêem-se, por isso, lídimos de singularidade: dizem-se diferentes, esboroam-se em detalhes de circunstância.

As pessoas que somos e que morreremos esquecem-se dos apenas átomos a que se resumem. Promove-se o esquecimento a espectáculo, assistindo, na primeira fila, a cénica razão. Vontade nossa - actores trémulos e com a vida decorada.

Nós, as pessoas, esquecemos inclusive os próprios sonhos, agulhados entre o palheiro. Não, talvez esses não os esqueçamos assim.

Os sonhos perdem-se como os botões, ninguém sabe como, mas todos lhes sentem a falta.

E as pessoas às vezes… o que é que eu disse?

terça-feira, 5 de julho de 2011

da Poesia...



A poesia é, ao mesmo tempo, um esconderijo e um altifalante.


Nadine Gordimer


***

Porque será a poesia tão versátil?
Sinceramente, acho esta pergunta fascinante, não pelo conjunto de seis palavras e um ponto de interrogação, mas pela infinidade de palavras e reticências que nos tentam dar a resposta.
Na poesia tudo está correcto. Não há um estilo a seguir… por outras palavras, um modelo a seguir! A poesia não são apenas versos…
Os versos são as ruas onde nos escondemos do mundo, num lugar deveras recôndito da sociedade! Os versos são fragmentos de alma a tinta no papel. A tinta só minha, onde escrevo sobre o que sinto. É, portanto, uma forma de fugir dos outros e encontrar nas palavras o esconderijo para que não me encontrem, para passar o tempo. Faço das palavras a sólida concha que me protege do outros seres. Uma forma de encontrar conforto e partilhar um pouco de mim comigo mesma.

Mas, ao invés do acima escrito, das palavras se fazem versos… os versos de um hino! Os versos não apenas escritos, mas também os que ecoam até aos confins do cosmos! Uma forma de nos revelarmos, de sermos ouvidos. Não rebeldes, mas revoltados… ou apenas gritar por paz, chamar-te “meu amor”, implorar aos deuses que me abençoem se a vida é infortuna. Assim como a música, no dia 25 de Abril de 1974, chamou militares à rua!
Retorno à questão inicial… talvez seja versátil porque cada ser sente de forma diferente, o que faz da poesia, não um texto, mas sim fragmentos de cada um de nós… único e especial. 



Catarina, 10ºA